MIKSANG: PARA MEDITAR FOTOGRAFANDO

MIKSANG: PARA MEDITAR FOTOGRAFANDO

No simples ato de fotografar uma flor pode estar a chave que você procura para manter o estresse a quilômetros de distância. Descubra como a fotografia pode ser uma arte contemplativa transformadora

 

Texto • Ingrid Calderoni
 


 

Quantas vezes deixamos de enxergar a beleza nas pequenas coisas do nosso dia a dia porque estamos cansados ou estressados? Ou então cultivamos aquele mau humor terrível, tenso, quando um pouquinho de dedicação a práticas simples e gostosas poderia trazer um bem-estar daqueles? Hoje, abrace essa ideia: pegue sua câmera fotográfica, abra a mente e foque o olhar em detalhes que normalmente passam despercebidos por você. Pode ser um cantinho da sua casa, uma árvore no caminho do trabalho, uma formação bonita de nuvens no céu...

É isso o que propõe a miksang (que significa "bom olho"), uma técnica de fotografia contemplativa baseada nos ensinamentos do mestre tibetano Chögyam Trungpa. O objetivo? Captar em foto, além do momento ou do objeto em questão, o sentimento que este proporciona, sempre buscando a tranquilidade e a paz de espírito.

“Quando a mente está aberta, a visão clara e o coração livre de tristeza, o ‘bom olho’ se manifesta”, diz Walter Morita, instrutor de meditação da unidade brasileira do centro Shambhala, presente em todo o mundo. Ele explica que, nas artes contemplativas, o "bom" não tem o mesmo conceito do "bom e ruim" arraigado nas culturas ocidentais. No miksang, "bom" é a ausência de preocupação e abertura para o novo, o que permite a captação da beleza natural das coisas.



 

Nessa dinâmica, é fácil ir além do ato de capturar a imagem. Estar consciente de seu próprio corpo, da sua respiração e das emoções que você está sentindo é o que torna a fotografia especial. Portanto, é essencial que, ao apertar o botão, você esteja em um estado meditativo, atento ao que ocorre dentro e fora do corpo, sem se preocupar demais com a técnica.

E, com a percepção afiada, vale fotografar de tudo: da maçaneta da porta às gotas de orvalho que se formam em uma folha. Nada precisa ter significado imediato. Livre de expectativas, você mata a tensão e se aprofunda na poesia e no sentimento da imagem. O clique só acontece quando o fotógrafo se sente verdadeiramente tocado por algo, seja uma cor, um movimento ou uma simples sensação.

Segundo Walter Morita, essa arte ainda é muito nova no Brasil, que não possui muitos especialistas em miksang. Mas diversas formas de meditação contemplativa – como ikebana (que produz delicados arranjos florais), caligrafia, dança, poesia, pintura e até culinária – vêm ganhando cada vez mais popularidade por essas bandas. Que tal, então, investir nessa poderosa técnica de relaxamento e ainda dar uma boa renovada em seus álbuns de fotos?



 

Momentos sublimes

Relaxe e tente redirecionar seu olhar. Preste atenção aos pontos em que você raramente se foca: beirais de telhados ou sarjetas, poças d'água, cadeiras de botequim, troncos de árvores...

As máquinas digitais são ideais para praticar miksang, pois com elas não é preciso se preocupar com gastos em filmes fotográficos. Assim, "errar ou acertar" no clique deixa de ser uma preocupação.

Para ter um guia de referência, você pode adotar temas em suas saídas fotográficas: hoje, você vai fotografar apenas luzes, por exemplo. Amanhã, elementos da natureza. O processo fica ainda mais prazeroso.

 

Enxergando o mundo como ele é

Antes de sair clicando, é recomendável preparar a mente com 15 ou 20 minutos de meditação tradicional, para ajudar a aguçar a percepção e despoluir o olhar.

Para meditar, sente-se confortavelmente em um local agradável e silencioso, onde você se sinta em paz. Com as costas eretas e as pernas cruzadas, foque toda a atenção em sua respiração, no ar que entra e sai das narinas. Assim, relaxe e concentre-se no momento. Depois de 20 minutos, prepare seu material e saia para fotografar, de preferência em um lugar tranquilo e sem barulho. Bom exercício!

"A prática da meditação não é feita para limpar a mente, nem mesmo esvaziá-la, mas para nos tornar unos com nossa essência verdadeira", explica Monja Cohen, fundadora da Comunidade Zen Budista do Brasil. Assim, em contato profundo com nós mesmos, ficamos mais capazes de enxergar além das imagens rotineiras.

Fonte: Triada.com.br